Câmara de Cabo Frio fará audiência pública sobre mega parque aquático
Últimos detalhes para o debate sobre empreendimento no entorno da Praia das Conchas e Ilha do Japonês estão sendo acertados junto à Comissão de Meio Ambiente
Até o final de junho deste ano a Câmara de Vereadores de Cabo Frio deve promover uma audiência pública para debater, com a população, a construção do Nova Cabo Frio Water Park. O megaempreendimento particular, composto de parque aquático, espaço de aventuras, centro de entretenimento, beach club e resort, além de lojas, restaurantes e lanchonetes, tem previsão de ser erguido nos próximos anos dentro de uma área do Parque Estadual da Costa do Sol (PECS), entre as praias das Conchas, Brava e Ilha do Japonês. À Folha, o presidente da Câmara, Miguel Alencar, afirmou, esta semana, que os detalhes finais para a realização da audiência já estão sendo alinhados com os membros da Comissão de Meio Ambiente do legislativo. Ele garantiu o debate será realizado ainda no primeiro semestre.
Desde que foi anunciado, o empreendimento vem colecionando polêmicas. Mesmo que seja uma área particular, que desde março de 2011 pertence a uma empresa de São Paulo (São José Desenvolvimento Imobiliário), ambientalistas questionam uma possível degradação de área verde. Embora esteja dentro do Parque Estadual da Costa do Sol, fontes da Folha no Instituto Estadual do Ambiente (Inea) explicaram que o trecho onde se localiza o mega empreendimento (cerca de 250 mil m²) tem autorização para construção porque trata-se de uma “zona de amortecimento”, que são áreas que ficam no entorno – e não dentro – de Unidades de Conservação Integral. “Pode ter gente morando, pode ter construções, mas o poder público precisa ter um olhar mais criterioso, e essas construções precisam ser debatidas”, explicou um técnico que pediu para não ser identificado.
Em entrevista à Folha, um dos sócios do empreendimento, Fernando Gomes Fonseca, garantiu que todos os projetos relativos à construção do Nova Cabo Frio Water Park levam em conta a preservação ambiental e respeitam as leis ambientais. Afirmou que a audiência pública anunciada pela Câmara “trata-se de uma exigência legal para a aprovação final do projeto”.
Atrações do espaço de aventuras já
receberam veto do Inea
De acordo com o Estudo de Impacto Ambiental, o resort do Nova Cabo Frio Water Park será composto por três vilas hoteleiras com um total de 536 unidades habitacionais, cada uma com capacidade para até 4 pessoas, totalizando mais de dois mil hóspedes/dia em lotação máxima. Já o complexo aquático terá capacidade para até 15 mil turistas/dia. O projeto prevê a construção de receptivo, vestiários, lojas, hamburgueria, pizzaria, restaurante, banheiros, quiosques e bar molhado, além de piscinas (com onda, sem onda e thermal com borda infinita), toboáguas, quadras de beach tennis, rio lento e outras atrações. O custo total do projeto é de cerca de R$ 500 milhões.
Fernando Gomes Fonseca explicou que um dos projetos que compõem o Nova Cabo Frio Water “ainda depende de uma série de estudos e autorização do Ibama e da União” e que a conclusão dessa primeira fase deve levar em torno de dois anos. Sobre o espaço de aventuras, o empresário revelou que já teve a parte arquitetônica aprovada pelo Inea.
– Agora começa a fase de desenvolvimento do projeto executivo, que ainda não foi concluído. Por este motivo, ainda não existe previsão de quando as obras vão começar – contou Fernando.
Mas nem todas as atrações foram liberadas. Um documento assinado pela Gerência de Unidades de Conservação do Inea em julho de 2023, ao qual a Folha teve acesso, revela que os projetos de implantação do arvorismo, e de uma tirolesa ligando o mirante da Praia das Conchas ao Morro do Vigia, receberam oposição do órgão.
Outros projetos, como implantação centro de apoio, torre 01, ponte, mirante e deck, foram liberados desde que atendessem os requisitos da Resolução Inea nº 216/2021; tivessem aprovação dos demais setores técnicos relacionados à análise do processo, incluindo os aspectos estruturais e de esgotamento sanitário e fossem apresentados aos Conselhos Consultivos do PECS e da APA do Pau Brasil para que fossem ouvidas eventuais considerações dos conselheiros.
Também foram feitos ponderamentos sobre a obrigatoriedade do empreendimento não comprometer os objetivos de criação do PECS, nem a manutenção dos seus recursos e valores fundamentais, bem como os da APA do Pau Brasil, e de adotar medidas pertinentes para o controle e monitoramento da visitação. O documento também pede que o empreendedor seja “cientificado de que a qualquer momento este posicionamento poderá ser revisto, caso se constate que estejam ocorrendo impactos negativos ao PECS e à APABR”.
Demolição de quiosques acende alerta
sobre efeitos colaterais da especulação imobiliária
Além da polêmica envolvendo a construção do Nova Cabo Frio Water Park, ambientalistas também apontam o constante interesse de especulação imobiliária no entorno da Praia das Conchas, principalmente depois da ordem da Justiça Federal para retirada dos últimos 11 quiosques que restaram na orla da Praia das Conchas. As demolições aconteceram nesta terça (30) com apoio estrutural da Prefeitura de Cabo Frio.
Após ser questionada pela Folha sobre a recomendação feita pelo Ministério Público Federal (MPF) para retirada dos acessos às Conchas e Ilha do Japonês colocados pela empresa que opera o estacionamento, pertencente ao mesmo grupo interessado em futuros empreendimentos na área, a prefeitura havia anunciado que iria remover todos os obstáculos também no dia 30.
“A Prefeitura de Cabo Frio informa que a cancela, na beira da Praia das Conchas, já foi retirada. Já a da entrada do estacionamento da Ilha do Japonês está em área privada e o proprietário foi notificado, em março, para mudança de local”, diz nota enviada ao jornal.
A mais nova suspeita está sendo motivada por um documento onde a São José Desenvolvimento Imobiliário apresenta todas as estruturas previstas para o Nova Cabo Frio Water Park. Em uma das páginas, a empresa informa que o terreno de sua propriedade tem cerca de 4 milhões m², incluindo toda a área utilizada como estacionamento na Praia das Conchas e também na Ilha do Japonês. Desse total, cerca de 2,8 milhões estão dentro de Unidades de Conservação Integral do PECS.
Dos pouco mais de 1 milhão m² restantes, o complexo de lazer e turismo será erguido em uma área de cerca de 250 mil m². Em outras páginas, a empresa paulista aponta uma série de problemas que foram encontrados dentro e no entorno do terreno de sua propriedade. Um dos trechos cita como “problema” os quiosques da Praia das Conchas, e afirma que eles ocupam espaço de lazer na orla, funcionam sem alvará, com condições sanitárias precárias e descarte de esgoto direto do mar. Embora o material deixe claro que as estruturas são alvo de ação de despejo por parte da União, cita como solução um dos projetos da Nova Cabo Frio Water Park: a construção de 12 quiosques com estruturas de containers (totalmente removíveis) dentro da área do empreendimento. Os ocupantes dos quiosques irregulares serão convidados a ocupar a nova estrutura mediante contrato de locação, segundo os empreendedores.
– A especulação imobiliária nunca venceu naquela área e não vai vencer agora. O que a gente vê ali, claramente, é o assédio da especulação imobiliária há muito tempo. Em 2008 teve aquele empreendimento espanhol. Em 2013, perto daquela região, tentaram um condomínio de luxo, que não foi pra frente. E agora tem essa questão que não é ali, mas é perto. Ou seja, essa é uma área de grande interesse imobiliário. Por isso temos que ficar atentos – comentou Lucas Muller, que há poucos dias assumiu uma cadeira do Conselho Municipal de Meio Ambiente.
Ele revelou, também, que está acompanhando de perto todas as conversas com relação à nova ordenação da orla e recuperação da área já degradada, a exemplo do que foi feito em Saquarema e Búzios.