Criada em 1997, a lei federal nº 9.504, que estabelece que cada partido deve preencher um percentual mínimo de 30% de candidaturas femininas entre seus candidatos, gerou a primeira cassação de mandato em Cabo Frio. E foram logo duas ao mesmo tempo: conforme a Folha dos Lagos já havia divulgado no último dia 6, Vanderson Bento (PTB) e Vinícius Corrêa (PP) foram cassados pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE/RJ) acusados de terem se beneficiado de fraude à cota de gêneros cometida pelos seus partidos na eleição municipal de 2020.

A cassação dupla foi motivada por uma ação judicial de autoria de Átila da Ótica (Avante). Segundo o Cartório Eleitoral de Cabo Frio, Vanderson e Vinícius devem deixar o cargo na próxima semana, assim que for homologado o resultado na nova recontagem de votos, feita na última sexta-feira (16), e que anunciou Ruy França (Cidadania) e Átila como novos vereadores. A diplomação e posse dos novos legisladores também deve acontecer na próxima semana, de acordo com o TRE.

Embora ainda não tenha tomado posse, esta semana Átila já começou a frequentar a Câmara de Vereadores. Na terça-feira (13) de manhã, participou de uma reunião com o presidente do Legislativo, Miguel Alencar. De tarde, conversou com a reportagem da Folha e falou sobre as mudanças que as duas cassações podem gerar na eleição municipal de 2024. Ele também deixou clara sua posição em relação ao governo José Bonifácio.

– Hoje sou oposição. Não compactuo com algumas ações do atual governo. Porém não posso deixar de dialogar. Nosso gabinete vai estar sempre de portas abertas para ouvir e trabalhar em pautas que possam beneficiar a população – contou.

Folha - Essa foi a primeira vez na história política de Cabo Frio, desde que foi instituída a cota de gêneros, que vereadores da cidade foram cassados por fraude. E foi sua ação quem conseguiu isso. Você acredita que isso vai servir de exemplo nas próximas eleições? Por quê?
Átila - Realmente é um fato histórico na política de Cabo Frio. Vai ficar gravado para sempre e, com certeza, vai ser exemplo nas próximas eleições. Os dirigentes de partidos políticos vão ter que ter um olhar mais especial com as mulheres, e isso é fundamental para uma eleição mais justa e igualitária. Agora as mulheres serão verdadeiramente valorizadas.

Folha - Foram três anos da ação tramitando. Muitas pessoas não acreditavam que esta ação teria resultado. Outras achavam que um possível resultado sairia somente depois da eleição de 2024, perdendo seu efeito. Que avaliação você faz?
Átila - Nosso processo foi bastante complexo. Foram quatro partidos investigados, e isso demanda tempo. Todos têm o direito de defesa e recursos, isso acaba dando morosidade ao processo, mas sempre acreditei que seria este ano. Até porque se o processo acontecesse depois das eleições 2024, seria um instrumento sem credibilidade. A sensação de injustiça seria ainda maior, e as fraudes, nesse sentido, só iriam crescer. Hoje a justiça foi feita, e os culpados foram penalizados dentro do mandato. Serve de exemplo, e é isso que a gente precisa: acreditar na Justiça.

Folha - Acredita que este resultado pode influenciar o resultado das ações contra outros partidos?
Átila - Por já ter jurisprudência, pode influenciar, sim.

Folha - Qual o sentimento que fica após vencer um processo importante como esse?
Átila - Alma lavada e alegria, não só pra mim, mas para os quase mil votos de pessoas que acreditaram no nosso trabalho. A Justiça está aí para se usufruir. Todo cidadão pode acionar a Justiça para reparar danos, e com a gente não foi diferente. Hoje, a sensação na cidade, é que realmente a justiça foi feita.

Folha - Embora seja uma ação por fraude à cota de gênero, que teoricamente prejudicou mulheres candidatas, serão dois homens empossados como novos vereadores. Que avaliação você faz disso? Acha que a cota de gêneros funciona?
Átila - O processo ocorre em todo Brasil, e na sua maioria, as mulheres são usadas somente para compor a cota. Esse tipo de processo vem para acabar de uma vez por todas com esse tipo de conduta fraudulenta por dirigentes de partidos. Como eu disse anteriormente, nas próximas eleições os partidos vão ter que olhar as mulheres com muito mais valorização, vão ter que repassar os valores de fundos partidários, vão ter que dar condições igualitária de trabalho, e isso é fundamental. Eu mesmo recebi reclamações de várias mulheres que foram candidatas, que receberam promessas de ajuda de dirigentes, e na hora foram esquecidas. Na verdade, foram enganadas. Por isso, a cota de gênero, a partir de agora, vai funcionar na cidade de Cabo Frio porque ninguém mais vai querer perder mandato.

Folha - Você ainda não tomou posse, mas já sabe como pretende direcionar seu mandato até dezembro de 2024? Quais serão suas bandeiras?
Átila - Provavelmente devemos tomar posse na semana que vem. O feriado (de Corpus Christi) atrasou um pouco os trâmites internos do TRE. Nosso mandato vai ser direcionado sempre no diálogo, buscando instrumentos que sejam de benefícios à população.

Folha - Acha que essa ação fortalece seu nome para uma reeleição em outubro de 2024?
Átila - Nosso nome hoje é leve. Tenho um carinho enorme da população cabo-friense. Onde eu passo, as pessoas me elogiam pelo belo trabalho e pela coragem. Em duas eleições sempre fui bem votado, e devido a esse processo tivemos uma repercussão ainda maior. Com certeza fortalece muito o nosso nome para as próximas eleições. Porém, agora temos que trabalhar dobrado, afinal estamos chegando para mostrar oficialmente nosso trabalho como vereador de Cabo Frio. Mas quero agradecer a todos que acreditaram. Foi uma luta muito árdua, porém vitoriosa. Sempre digo que os humilhados serão exaltados, e isso verdadeiramente aconteceu comigo. Não tenho vaidade alguma, não tenho apego pelo poder. Quero apenas ser um instrumento que possa modificar a vida da população cabo-friense. Mesmo que pequeno, quero deixar nosso legado de forma positiva. O Átila da Ótica vai continuar sendo o mesmo de sempre, aquele cara amigo e sorridente com as pessoas. Nosso gabinete vai estar de portas abertas para todos.