Mangueira arrasta o povo em noite marcada por apresentações irregulares na Sapucaí
Verde e Rosa é destaque positivo do domingo; e Grande Rio está na briga pelo bi, com desfile leve em homenagem a Zeca Pagodinho
Um clichê comumente dito entre a primeira e a segunda noites de desfiles das escolas de samba do Grupo Especiao carioca é de que a "campeã ainda não passou". Trata-se de uma afirmação com grande fundo de verdade histórica, dado que a agremiações que desfilam no domingo só triunfaram sete vezes desde que o concurso passou a ser realizado em dois dias, a partir de 1984.
Neste ano, ao fim da primeira noite de cortejos na Avenida Marquês de Sapucaí, a impressão é que o resultado novamente vai reforçar o tabu, visto que, em maior ou menor grau, as seis escolas que passaram pela Avenida tiveram apresentações irregulares. Apesar disso, houve destaques positivos e o maior deles seguramente foi a Estação Primeira de Mangueira.
Fazendo valer a antiga familiaridade em cantar a Bahia e seu universo cultural, o que já lhe rendeu títulos em 1973 (Lendas do Abaeté); 1986 (Caymmi) e 2016 (Maria Bethania), a Verde Rosa proporcionou uma bela e vibrante apresentação, seduzindo o público com um samba aliciante que pegou no gosto popular. Na parte plástica, a Mangueira passou de forma correta, embora sem muita originalidade e, em alguns casos, de forma até simples para a magnitude de espetáculo, caso da alegoria do trio elétrico. A escola "onde o Rio é mais baiano" deixou a pista com a convicção de pode brigar por uma vaga mas Campeãs e até por melhor sorte, dependendo do desempenho das concorrentes da segunda noite.
Com uma homenagem ao cantor Zeca Pagodinho, a Acadêmicos do Grande Rio também fez uma ótima apresentação, mas longe da catarse promovida no ano passado. Com um belíssimo conjunto alegórico, de forte apelo lúdico, a escola passeou com leveza por elementos da cultura suburbana e símbolos associados ao homenageado, como a religião, vida pacata na rural Xerém e o Carnaval, com uma bela homenagem à centenária Portela e as demais escolas. A entrada do homenageado no último carro foi um dos pontos altos. Zeca não decepcionou e levantou o copo para o público, que foi ao delírio.
O samba de refrão popular foi bastante cantado pela escola, graças ao grande desempenho de Evandro Malandro no cargo de som e a excelente noite da bateria de Mestre Fafá. Os percalços em evolução, contudo, podem atrapalhar o sonho do bicampeonato.
Outra escola que deve gabaritar nos quesitos estéticos é o Salgueiro. A Vermelho e Branco do Andaraí abusou da sua principal cor na cabeça da escola, com variação cromática pra tons mais escuros nas alas seguintes. Tudo para trabalhar com luxo e criatividade ps elementos do inferno e do céu no enredo "Delírios de um Paraíso Vermelho". Mas o fato é que o desenvolvimento confuso prejudicou a compreensão do público. Por outro lado, o contestado samba cresceu de rendimento na Avenida graçasao rendimento do carro de som e da bateria, proporcionando um canto forte e uma harmonia coesa da escola.
Contudo, a escola deve perder preciosos pontos em evolução por causa de problemas para fazer os imensos carros alegóricos entrarem na Avenida. No balanço de perdas e danos, o Salgueiro deve brigar obra voltar no sábado das Campeãs, mas depende do desempenho das escolas da segunda noite para saber suas reais possibilidades.
Assim como a Grande Rio, o Império Serrano trouxe para a Sapucaí a vida e obra de um dos maiores sambistas brasileiros: Arlindo Cruz. A escola da Serrinha cantou com emoção o samba, mas a escola pecou pela irregularidade na parte estética, com falhas de acabamento e iluminação em alguns carros. No último deles, o momento de maior emoção, com a presença do homenageado rodeado dos amigos e parceiros. No geral, foi uma apresentação calorosa e vibrante, que pode fazer a escola sonhar com a permanência no grupo de elite do Carnaval carioca.
Aliás, disputa na segunda metade da tabela deve ser intensa na abertura dos envelopes, na quarta-feira de cinzas. Afinal, é nessa zona de classificação que devem ficar Mocidade Independente de Padre Miguel e Unidos da Tijuca.
A escola da Zona Oeste entrou na pista com a tarefa de desfazer a impressão ruim do ano passado mas, infelizmente, não teve sucesso na tarefa, ao contar a história dos discípulosde Mestre Vitalino, da cidade de Alter do Chão (PE). Em que pese a beleza na concepção das alegorias, o velho calcanhar de Aquiles, o acabamento, novamente foi a pedra no sapato. O samba de bela linha melódica não empurrou o desfile da escola da Vila Vintém, que passou fria sob a indiferença do público. As fantasias passaram com melhor qualidade, mas o figurino da porta-bandeira Bruna Santos deu problema logo na área de armação e pode ter prejudicado sua apresentação, visto que a bandeira da escola enrolou bem em frente à um dos módulos de julgamento. Erros que prometem tornar tensa a quarta-feira de cinzas.
Por fim, a Tijuca se não comprometeu tampouco empolgou. A escola do Borel não mostrou criatividade para falar das lendas e histórias da Baía de Todos os Santos. A agregação teve destaque na comissão de frente, com a presença da atroz Juliana Alves, como Iemanjá. A bateria Pura Cadência de Mestre Casagrande mostrou a competência habitual, mas o samba não foi capaz de proporcionar um desempenho vibrante, que impulsionasse a agremiação para uma melhor colocação.