Habitada por gente simples, e tão pobre, que só tem um sol que a todos cobre, como podes Mangueira cantar”. Belos versos, Mestre Cartola. A letra de ‘Sala de Recepção’ mostra bem o que é a Estação Primeira. Uma escola que atravessa a pirâmide social como um carro alegórico na avenida, colorindo de verde e rosa os corações dos ricos e pobres, tricolores e rubro-negros, religiosos e ateus. Assim também é o Santo Samba, que comemora três anos neste domingo com homenagem a dois gigantes da ‘Mais Querida’: Cartola e Nelson Cavaquinho. A sala de recepção do Costa Azul estará aberta a partir das 15h. As entradas custam R$ 15.
“Pois então saiba que não desejamos mais nada, a noite, a lua prateada, silenciosa, ouve as nossas canções”. Sábio Cartola. Não é preciso realmente desejar muito para apresentar uma roda de samba de primeira. Assim prova a idealizadora do Santo Samba nesses três anos. Luciana organiza o evento no primeiro domingo de cada mês gratuitamente na Praça São Benedito, na Passagem.
A escolha não poderia ser melhor: um ambiente bucólico de um dos bairros mais charmosos de Cabo Frio, que transformou a praça numa capital do samba. Também pudera, após tantas edições que se iniciavam na tarde e se estendiam até à noite, com a lua, silenciosa, ouvindo o som das batucadas.
“Tem lá no alto um cruzeiro, onde fazemos nossas orações, e temos o orgulho de ser os primeiros campeões”. A benção, Cartola. As preces foram atendidas. Afinal de contas, sobram motivos para a primeira campeã do Carnaval carioca (1932) se orgulhar. Desde que foi fundada pelos sambistas Cartola, Carlos Cachaça e Zé Espinguela, em 1928, são 17 títulos – atrás apenas da Portela, com 23. A escola ainda ostenta uma lista de nomes consagrados na música brasileira com os homenageados do dia e outros como Beth Carvalho, João Nogueira, Nelson Sargento e Chico Buarque. Muitos deles, inclusive, cantados em verso e prosa, em verde e rosa, nas noites do Largo São Benedito.
“Eu digo e afirmo que a felicidade aqui mora e as outras escolas até choram, invejando a sua posição”. Ao som de Cartola e Nelson Cavaquinho, é realmente difícil ficar triste. No aniversário do Santo Samba, o cantor Makley Matos, um capixaba de alma carioca, é o responsável por um repertório de dar inveja. Morador da Lapa, a capital da boemia carioca, carrega uma bagagem de contato com grandes nomes da escola como Nelson Sargento e Beth Carvalho. Ele aparece num vídeo da página do evento convidando os cabofrienses para o show e batucando um pandeiro, numa pequena prévia.
“Minha Mangueira, essa sala de recepção. Aqui se abraça o inimigo como se fosse irmão”. As portas dessa sala de recepção estiveram abertas para os amantes do gênero. Mas nem tudo acabou em samba. A luta da idealizadora contra a falta de parceria do poder público rendeu o afastamento do evento da praça durante quatro meses. Havia dificuldades para arrecadar recursos numa festa gratuita. Mas o samba não morreu, tampouco acabou. E pior: abraçou até o inimigo, como se fosse irmão.
– As principais dificuldades são de apoio estrutural. É difícil realizar um evento na rua sem bilheteria. O custo é significativo. É um evento público que a cidade não reconhece. Mas celebrar três anos de um evento que nasceu para ser em um dia é incrível – comemora, apesar dos pesares.