Cabo Frio completa 409 anos de fundação nesta quarta-feira (13). Parte da história da cidade é contada por livros publicados pela Sophia, editora cabo-friense que tem montado acervo que ajuda a contar a história da Região dos Lagos e do Brasil. Uma dessas obras, “Cabo Frio Revisitado – a memória regional pelas trilhas do contemporâneo”, tem sido utilizada com frequência como bibliografia para pesquisas em universidades do Rio de Janeiro. Organizado por Ivo Barreto, o livro reúne artigos assinados por 20 pesquisadores, que contextualizam, por exemplo, a história da indústria salineira na região; a engrenagem do tráfico de escravizados no antigo Cabo Frio; a pesca tradicional da Região dos Lagos; a vida e espaço dos sambaquieiros, primeiros habitantes da região; entre outros temas.
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Segundo Lívia Colonese (foto), recém-formada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal Fluminense, “Cabo Frio Revisitado” foi fundamental para ajudá-la a traçar um paralelo poético entre a luta do movimento de mulheres de Cabo Frio e a restinga que cobre parte da cidade.
– Esse livro abriu os meus olhos para a multidisciplinaridade que temos na cidade. Ele me ajudou não só durante a pesquisa, mas também no entendimento da minha identidade como cabo-friense. O meu tema foi sobre a casa Etienne Romeu, uma ocupação de mulheres do movimento Olga Benário. E, além de abordar todas as questões de urbanismo, plano diretor, eu propus um projeto de intervenção naquela casa. Nesse trabalho fiz um paralelo porque entendo que a luta das mulheres da região é muito semelhante à luta da restinga, uma vegetação de resistência. E o livro me ensinou muito sobre a natureza da cidade em relação à cultura, e me ajudou bastante a surfar nessa onda de raciocínio – revelou.
Já Paulo Roberto Vieira do Rego, formado em História pela UniRio, conta que "Cabo Frio Revisitado", assim como outras publicações da Sophia, ajudam os pesquisadores a lidar com a escassez de produções acadêmicas voltadas para a história local.
– Apesar do conhecimento específico sobre o tema que eu havia delimitado – a relação entre o crescimento do turismo e a preservação dos bens culturais de Cabo Frio –, senti a necessidade de possuir um arcabouço teórico sobre a cidade em si, pensando-a de forma interdisciplinar. Nesse sentido, o livro foi de grande proveito, já que as contribuições são feitas por estudiosos de especializações e abordagens diversas, abrindo espaço para leituras variadas da cidade. No sentido estritamente acadêmico, o livro foi muito frutífero pelo contato com a pesquisa de novos autores e a profusão de fontes sobre o tema, o que impactou diretamente no meu trabalho.
Além do auxílio na pesquisa acadêmica, os recém-formados contaram que a publicação revelou diversos insights sobre a cidade. Paulo, por exemplo, destacou o capítulo sobre a construção do conjunto paisagístico de Cabo Frio, e também o que trata dos cantos da praia.
– É disruptivo comparar as imagens atuais da Praia do Forte com aquelas fotografadas por Wolney Teixeira. O protagonismo do pescador local, como observado na fotografia do Tarrafeador, de 1938, foi esvaecendo paulatinamente, tanto com a chegada dos turistas – e da transformação do litoral como “área de lazer” – como também pelas mudanças nas formas de produção. É uma cena usual ver visitantes tratando os cantos da praia como locais de dissonância, percebendo os pescadores enquanto agentes estranhos, quando na verdade, a lógica é inversa – pontuou.
Formada pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, Gabriela Peres contou que desejava fazer uma análise do processo de urbanização da Região dos Lagos ao longo dos anos, relacionando à cultura tradicional local.
– O livro foi muito importante como referência bibliográfica porque confirmou que existe uma consequência para estarmos na posição que nos encontramos hoje enquanto Região dos Lagos, desde o nosso georreferenciamento no planeta, até todos os marcos na paisagem das mudanças ocorridas ao longo de nossa história. Ao longo da leitura é possível aprender não só sobre os desdobramentos históricos / políticos / sociais da região, mas também compreender o valor de nosso território com patrimônios naturais, materiais e imateriais – contou.
Ao folhear as páginas do livro, Gabriela disse ter descoberto um mundo de estudo e pesquisa aprofundada sobre Cabo Frio e a Região dos Lagos.
– O livro traz uma coletânea de publicações científicas adaptadas à literatura para difundir o conhecimento sobre a cidade e a região servindo como fonte de pesquisa para assuntos de diversos campos como biologia, geologia, antropologia, urbanismo, patrimônio, história, saberes tradicionais e outras temáticas. Toda a cosmologia do livro compõe uma identidade comum que encontramos por toda a região.
Recém-formado, Pedro Magalhães contou que o primeiro contato que teve com "Cabo Frio Revisitado" foi durante a pesquisa para o trabalho de conclusão de curso em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal Fluminense.
– O objeto da monografia foi um projeto, intitulado "Vila Pesqueira da Salga", que propunha um conjunto de equipamentos públicos de apoio à atividade pesqueira na localidade da Pedra da Salga, em Iguaba Grande, com ênfase na valorização da paisagem cultural da pesca artesanal e do patrimônio geológico. Para embasar tal proposta, eu buscava referências sobre a história e a cultura da região do antigo Cabo Frio, especialmente sobre a pesca artesanal e a Lagoa de Araruama. Nesse processo, fui apresentado à obra por meio de uma palestra do Ivo Barreto sobre um dos capítulos. A partir daquele momento, o livro se tornou uma fonte valiosa de pesquisa para meu trabalho, e minha produção encontrou na coletânea de textos um rico referencial teórico que me balizou durante todo o processo criativo. A escolha por essa publicação se deu principalmente por conta da visão multidisciplinar sobre a história da região. Cada capítulo aborda a região a partir de uma perspectiva diferente — como história, geografia, sociologia, biologia, etc. — o que me proporcionou uma visão mais abrangente e completa do tema – revelou.
Para Pedro, a descoberta mais importante que o livro proporcionou foi entender a importância da Pedra da Salga como patrimônio natural e geológico. A partir da leitura, ele conta que conseguiu aprofundar a pesquisa sobre a formação rochosa e sua relação com a história da ocupação da área.
– Além disso, o capítulo sobre a cultura da pesca artesanal me proporcionou um novo olhar sobre a relação entre o homem e a natureza na região. A partir das histórias e relatos dos pescadores, pude perceber a importância da atividade pesqueira para a identidade cultural da região e como a minha proposta para a Vila Pesqueira da Salga poderia contribuir para a preservação e valorização dessa cultura – contou.
Por tudo o que descobriu nas páginas do livro, Lívia afirma que a publicação deveria ser trabalhada nas escolas.
– É muito importante que nossa população reconheça nossas riquezas e tenha o sentimento de pertencimento, porque sempre achamos que o outro é que é belo. Quando pararmos para perceber a nossa cidade é que vamos ver o verdadeiro valor que ela tem, que foi exatamente o que aconteceu comigo. Nesse sentido o livro é incrível – contou.
Em “Cabo Frio Revisitado”, o arquiteto Ivo Barreto reuniu temas de estudo sobre a formação geológica da região, o período de escravidão, a pesca tradicional, a Fazenda Campos Novos, o conjunto paisagístico da cidade, a ocupação salineira e a vida e espaço dos primeiros habitantes da região.
– O livro foi um recorte (pois as pesquisas já são muitas) e está pensado como uma porta de entrada e mergulho no campo da memória, trazendo dados, mas sobretudo apontando caminhos possíveis e conexões às vezes pouco percebidas. Ao morador da cidade ou para aquele que com ela convive há anos, é uma oportunidade de uma viagem pelo tempo da paisagem e do homem nestas bordas da laguna de Araruama, na companhia narrativa de textos deliciosos, comprometidos com o rigor científico, mas extremamente acessíveis, textos que pedem um café longo e alguns dedos de prosa depois – destacou Ivo.
Fazem parte da obra, além de Ivo Barreto, os autores Cyl Farney Catarino de Sá, Antônio Carlos Silva Andrade, Viviane Stern da Fonseca Kruel, Dorothy Sue Dunn de Araujo, João Henrique de Oliveira Christovão, Jonatas Carvalho, José Marcello Salles Giffoni, Paulo Sérgio Barreto, Jullia Turrini, Kátia Leite Mansur, Daniel Souza dos Santos, José Carlos Sícoli Seoane, Luiz Guilherme Scaldaferri Moreira, MaDu Gaspar, Gina Bianchini, Maria Cristina Ventura, Nilma Teixeira Accioli, Schneider Franco dos Santos e Walter Luiz Pereira. Gustavo Rocha-Peixoto assina o prefácio e Aline Bonioli Paiva Colonese, carta ao professor.