No Cabo Frio de antigamente, o abastecimento de água era obtido através dos poços, geralmente localizados nos fundos das casas, ou na frente, como na casa de pedra de Rosalina Ferro, antiga moradora local. Havia ainda os poços comunitários nos bairros Itajurú e São Bento, utilizados pela população carente. Também chamados de “cacimbas”, os poços tinham uma borda redonda, eram construídos com pedras ou anéis de cimento, e adentravam na terra numa profundidade variável, conforme o lençol freático. Normalmente com um balde e uma corda extraiam o precioso líquido para uso doméstico; algumas residências utilizavam uma bomba manual, o que muito facilitava a tarefa; não existia energia elétrica nas casas. Às vezes acontecia de um poço secar, aí era preciso descer ao fundo e escavar, aprofundando-o.
Hoje, praticamente inexistente, a figura de um poço é utilizada como metáfora para representar uma situação sem saída, um estado de calamidade, ou o último estágio de uma crise física, financeira ou social. Mas, por mais paradoxal que nos possa parecer, estar no fundo do poço não é o fim. Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), filósofo grego, é autor da seguinte frase: “No fundo de um buraco ou de um poço, acontece descobrir-se as estrelas”. Nesta linha de pensamento está a escritora britânica Joanne K. Rowling, famosa autora dos livros sobre Harry Potter, que disse: “O fundo do poço se tornou a base sólida sobre a qual eu reconstruí minha vida”.
Há uma fábula que conta a história de um cavalo que caiu em um poço fundo e não conseguia sair. Seu proprietário tentou por todos os meios retirá-lo, chamou os vizinhos e amigos para ajudar, e nada dava certo. Resolveram, então, jogar terra dentro do poço e assim enterrar o animal (vivo? Que maldade!). Enquanto a terra era atirada para o interior do buraco, o cavalo se debatia e a pisoteava. Os homens perceberam que as pisaduras criavam um novo piso que tornava o poço cada vez mais raso, e logo o cavalo aflorou à superfície, libertando-se.
O fundo não é o fim, muito pelo contrário, na maioria das vezes é o recomeço. A lógica não explica como Alemanha e Japão, que saíram da Segunda Guerra Mundial arrasadas, no fundo do poço, hoje são exemplos de progresso e desenvolvimento. O escritor francês Gustave Flaubert (1821 – 1880) tem uma frase que nos remete a esta atitude de superação: “A recordação é a esperança do avesso. Olha-se para o fundo do poço como se olhou para o alto da torre”.
Muitos empresários, por falta de visão empreendedora, experimentam algo parecido. Os negócios minguam, as vendas escasseiam e a empresa se entrega ao desânimo, e aí o fim se aproxima. Mas, felizmente, começamos a ver que muitas corporações resolveram sair do marasmo e reagir. Como diz a letra de uma música de autoria de Paulo Vanzolini: “Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima/Reconhece a queda e não desanima”.
No campo político experimentamos uma situação de afundamento, a falta de escrúpulo, ganância, falta de ética e coisas semelhantes, jogaram tão bela e profunda ciência para além do fundo do poço. E diferentemente do que vem acontecendo no meio corporativo, não há sinal de que esta situação se reverta.
Se por um lado, estar no fundo do poço causa angústia e preocupação, por outro é uma oportunidade de se reinventar. O fundo do poço ensina lições que o topo de um monte jamais poderia ensinar.
Encerro com um ensinamento do professor e escritor Mário Sergio Cortella: “Quando estiver no fundo do poço, a primeira coisa a fazer para sair dele é parar de cavar”.