E de repente a sociedade se congela na dimensão dos eventos. É muito difícil a realização de qualquer abordagem compreensiva nesse terreno. O certo é que as coisas andam mudando de um jeito muito estranho, a despeito dos valores que sempre foram fundamentais ao processo civilizacional. Hoje há uma cruzada no campo da moral. A corrupção tomada como valor e colocada nesse espectro moralizante, tende a eliminar a argumentação pelo slogan, bastando para que se façam as bandeiras e palavras de ordem. Assim, grita-se de modo seletivo contra a corrupção de quem queremos combater e a de quem não queremos ver.
A sagração de paladinos é outro sintoma perigoso. Parece que gostamos de nos enganar, do mesmo modo que acreditávamos nos heróis de cavalaria daqueles contos de antes do sono. A ideia de um justiceiro contra aqueles de quem não gostamos, arrasta consigo uma grande tolerância aos meios usados, desde que o fim seja atingido. Ou seja, mata-se a formiga queimando-se a floresta. As pessoas parecem dispostas a abrir mão da democracia, do direito de defesa, da privacidade, do contraditório e de outras tantas prerrogativas coletivas em nome de uma sanha vingadora de um só nome.
A bem da verdade, só as próprias classes médias e altas devem acreditar que são protagonistas de alguma coisa, especialmente quando nos brindam com as suas criativas alegorias e adereços nas combativas marchas que organizam. São, em verdade, dóceis coadjuvantes de um processo que se reduz mediocremente a tomada pura e simples do poder sem a necessidade de correr o risco do enfrentamento nas urnas.
A despeito das culpas e punições, necessárias obviamente, observamos as delações com metodologia inusitada, na qual o delator mostra-se capaz de intuir as razões subjetivas dos atos que participara. E isso vira indício, retoricamente tido por prova, julgado e condenado pelos tribunais da mídia. Quem bate o martelo?
Nessa maré de ódios, não se discute um projeto alternativo tanto para as estruturas políticas quanto para o exercício do poder em geral. Não se sabe o que virá. O que podemos intuir é que há um lado de um modelo neoliberal, de outro uma tendência a clamar um novo 64 e, lá no canto do ringue, um governo que precisa desesperadamente de um novo norte. E todos eles querem a mesma coisa. Agora é melhor que tudo volta a sanidade e a legalidade.
Afinal, tem eleição por aqui também né...