A quantidade de votos nulos, em branco e, em especial, o considerável contingente de eleitores que simplesmente não compareceram às urnas nas últimas eleições, são indícios de que algo precisa ser repensado. O que assistimos vai além do desinteresse, ao contrário, pode ser creditado a um sentimento ainda pior, o desencanto. A política desencantada é aquela do mais do mesmo e isso aparentemente cansou o eleitor.
Com a ajuda da mídia e de instituições sociais mais sólidas, os casos de corrupção ou má administração da coisa pública vem ganhando notoriedade, nomes e sobrenomes. E isso tem contribuído bastante para que as pessoas comecem a pensar um pouco mais a sério, já que no final das contas, é no bolso do cidadão que a dor dos malfeitos é sentida.
O que parecia óbvio e não era visto agora começa a ser observado, como por exemplo, a evolução patrimonial dos políticos de modo totalmente incompatível aos seus ganhos regulares. Sinal de que o “rouba, mas faz” vai ficando para trás, para um passado permissivo e complacente com os donos do poder. O mesmo com relação ao nepotismo, já que a substituição da competência pelo vínculo afeta diretamente quem depende dos serviços públicos no cotidiano.
O eleitor vem se cansando dos deuses, dos salvadores da pátria e dos que jogam com a emoção do amor de pai e mãe do povo. E o seu jeito de expressar é a indiferença no maior objeto de desejo do político, o voto. E tampouco adianta lançar novas caras com os mesmos sobrenomes, o povo entendeu que a tão valorizada “política de grupo” é um circuito fechado, impermeável, impenetrável, um estratagema para manter o velho com roupas novas apenas.
Nem para os compradores de voto a vida tem sido fácil. O voto tem ficado caro, incerto. Tanto que muitos apelam para comprar também as facções criminosas, as igrejas e o que mais estiver disponível no mercado. Cada vez mais o vendedor “passa a perna” no comprador. Infelizmente isso ainda não se aplica aos cabrestos do emprego, do acesso diferenciados aos serviços públicos, o contrato, a vaga do filho na escola, o remédio e a cirurgia, tantas vezes sob controle férreo dos que deveriam ser apenas legisladores e fiscais desses mesmos serviços.
O cenário é tão estranho que os que se elegeram forjados nesse que-fazer se apresentam como não-políticos a aí sobram profissionais liberais com pinta de messias, de curandeiros e homens da lei, a destilar as melhores intenções, ocultando as piores práticas.
Pobre povo pobre.
Seja como for, o que esperar a cada nova eleição? Acredito que esse cansaço só se transformará em ânimo quando formos capazes de oxigenar a política. Mas isso não se faz sozinho, é preciso apoio e união dos que desejam isso de verdade. Até porque o sistema é cruel, vingativo, rancoroso e avesso a tudo que não seja seu próprio reflexo. Só não é imortal nem indestrutível, afinal, a pedra que mata esse gigante está nas mãos de cada eleitor.