Em um belíssimo publicado no jornal El País, em 2014, o jornalista Jaime Rubio Hancock trouxe à luz uma questão interessante sobre a origem das cores que foram associadas e naturalizadas como “de menino” e “de menina”. Citando trabalhos consistentes, como os de Jo B. Pauleti e Eva Heller, mostrou cientificamente o que a intuição já sabia: não existe nenhuma associação biológica que justifique a divisão de cores.
Na verdade, essa história é incrivelmente recente, remontando ao século passado, mais especificamente no período da Primeira Guerra mundial, quando na Europa se começou a usar tons pastéis (como o rosa e o azul) para as crianças. Antes, o branco prevalecia. A atribuição também variava. O rosa já foi considerado uma “cor masculina”, por ser derivada do vermelho, uma cor sanguínea. Para as meninas, a calma do azul seria mais “adequada”. O martelo só é batido pela imposição do marketing dos produtos na década de 80.
Portanto, associar opções sexuais ou definição de gênero por conta do uso de cores é algo tão arbitrário quanto ignorante. Usar preto era algo caro no século XVI e denotava poder e elegância. O vestir dos mortos e o luto em preto eram, portanto, restritos. Mas com os séculos se popularizaria. Porém, para o luto no Egito pedia-se o amarelo; na Indochina, o roxo; e no extremo-oriente, branco. A noiva também casa de branco desde que Maria de Médici lançou a moda no século XVII (e nada de vestidos muito simples).
Além das cores, as vestimentas também contam histórias. Na Roma Antiga, as crianças e jovens (e os solteirões) envergavam uma toga simples, a “toga pretexta”, branca com detalhes em púrpura. Ao crescer e se tornar um homem (e um cidadão), usa a “toga virilis”, branca e lisa. Agora, se o sujeito ambicionasse ser um político, passava a usar uma toga alvejada com esmero, se utilizando um composto calcário para atingir uma brancura máxima. Era a “toga cândida”, própria para os “candidatos”.
Até o século XV, havia uma grande dificuldade em identificar quem era quem nas batalhas. Matar por engano os aliados não era incomum. Assim, os uniformes começam a ser usado para diferenciar os soldados. Entretanto, toda essa “visibilidade” também transformava os guerreiros em alvos fáceis. O vestuário até a Era Industrial era marcado pela exclusividade das peças e cores conforme a posição social, a profissão, tornando-se uma espécie de “carteira de identidade”. E havia certa rigidez. Basta analisar o que determinava as “Pragmáticas”, leis que regulavam os costumes da nossa terrinha nos idos da colonização.
Na transição do século XIX para o XX os uniformes chegam às escolas. O vestuário também passa a ganhar toques da moda, formando tendências mais gerais, afinal, a produção em escala favorecia e precisava de grandes mercados. A mesma moda que passou a determinar o estilo dos escolares também flertou com as engrenagens da morte. Basta lembrar do corte de Hugo Boss para o estilo das fardas do exército nazista, em contraste dos uniformes sem estilo e sem humanidade, dados aos destinados a morrer nos horrendos campos de concentração. Para além das tropas e estudantes, os uniformes vão tomando conta do vestuário das profissões. Médicos usam branco, advogados usam ternos (masculinos e femininos), operários com macacões especiais e professores seus indefectíveis jalecos. Times de futebol e atletas de esportes coletivos e individuais também.
Hoje, o vestir é diverso, globalizado, multicolorido e multicultural. Os uniformes e os multiformes no nosso mundo pós-moderno.
(*) Paulo Cotias é professor de História.