Se você perguntar a qualquer criança ou jovem sobre o que ela quer ser quando crescer, é bem provável que escute como resposta alguma o desejo de ser empresário, professor, engenheiro, médico, advogado, artista, atleta ou, mais recentemente, alguma espécie de influencer digital. Tenho certeza de que todos nós já respondemos a perguntas como essa e com as mesmíssimas respostas (menos influencer, para os dos tempos mais analógicos).
Além das profissões, outras referências costumam ser escolhidas, sobretudo quando usamos um conhecido modelo para postagem nas redes, aquele com a nossa foto e um monte de setinhas apontando para tudo aquilo que acreditamos mostrar quem somos. Assim, torcer por um time, mostrar o estado civil, ter ou não filhos, ser pai ou mãe de pet ou planta, militar ou não em um partido, professar uma fé, ter o seu lugar no zodíaco, ou adorar a culinária italiana, são as etiquetas que penduramos em nós, na expectativa que o olhar do outro as reconheçam, e valorizem.
Nada disso responde à pergunta sobre quem somos. Hoje sou professor, mas amanhã posso ser médico e me afastar de qualquer coisa que me lembre o magistério. Posso trocar o meu time ou mesmo me interessar por um novo esporte. Posso não querer criar mais nenhum bichinho e o meu talento com plantas pode ter se mostrado um desastre completo. Posso trocar o café pelo chá ou vice e versa. Posso me casar, descasar, desacreditar no amor ou me tornar um sacerdote. Mas também posso me converter a uma nova fé ou deixar de acreditar que o Mercúrio retrogrado tem algum efeito na minha vida.
Na porta do antigo Oráculo de Delfos, dedicado ao deus grego Apolo a placa com os dizeres “conhece-te a ti mesmo” advertia os consulentes que desejavam obter as previsões e favores por meio das sacerdotisas: antes de qualquer sortilégio, lembre-se de que tudo o que o presente nos oferece e o que o futuro reserva, têm ligação com o que somos, pois o que somos interfere no como construímos a nossa realidade e as nossas relações.
Portanto, não são as escolhas que nos definem, nem os nossos atos. Incoerente? Não é. Quantas vezes fazemos coisas que depois nos arrependemos justamente pela conclusão de que aquele ato não combina com nosso âmago? Ou quando metemos os pés pelas mãos ao tentar seguir um modismo para nos sentirmos validados pela régua dos outros? Quão pesada se torna a personagem que criamos por pura necessidade de reconhecimento e aceitação?
O que somos é algo que só pode ser respondido se, pegando de empréstimo o carisma de Teresa D’Ávila, soubermos entrar, explorar, permanecer e avançar pelos caminhos e moradas do nosso castelo interior. Não é fácil, pois requer silêncio, recolhimento, honestidade, avaliação e coragem. E é uma descoberta pessoal que só conseguimos quando deixamos as camadas de tudo o que etiquetamos em nós ou permitimos que nos etiquetassem. O tempo para isso é igualmente individual. Pode levar uma vida inteira e não poderia ser diferente por ser essa resposta tão valiosa.