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Coluna

A cidade é viva

26 julho 2023 - 20h46

Revitalização tem sido uma palavra bastante utilizada atualmente quando se discute acerca do que fazer com determinadas áreas de uma cidade. O termo á autoexplicativo. Em termos urbanísticos, esse “retorno à vida” significa a recuperação ou transformação da funcionalidade de determinado espaço.

Ao longo da nossa história, temos inúmeros exemplos desse processo. Uma das primeiras referências que podemos inserir na nossa longa duração cultural é a que nos apresenta Sérgio Buarque de Holanda na construção metafórica do “semeador” e o “ladrilheiro”, mais especificamente o modelo colonizador de portugueses e espanhol, cujo desdobramento se percebe na forma como as cidades eram constituídas, seja a partir de movimentos espontâneos e absolutamente utilitários dos portugueses ou seguindo um padrão urbanístico, arquitetônico e funcional, no caso dos espanhóis.

Muitas das cidades brasileiras surgiram, desse modo, ao sabor das contingências. Lugares sem a menor estrutura compatível (até mesmo com as determinantes das ordenações reais), são elevadas em seu status devido a necessidade, por exemplo, de defesa contra invasores estrangeiros. Outra forma de criação e expansão das cidades se dá pelo florescimento das atividades econômicas. E dentro das cidades, suas áreas também vão se estruturando, não raro, em função dos arranjos produtivos.

Em alguns casos, esse movimento é planejado. Na Reforma Pereira Passos (RJ) no início do século passado, uma nova área central foi pensada e planejada. Porém, uma das consequências conhecidas, mas deliberadamente ignorada, foi a expulsão de milhares de pessoas pobres para as áreas periféricas, cujos arranjos da sobrevivência vieram a estruturar de modo cronicamente precário, novas comunidades. Migração populacional também se deu (e com ela novas áreas urbanizadas) em função da interiorização de complexos fabris ou polos de comércio, por exemplo. A questão que se apresenta é que as cidades são organismos e, como tal, possuem dinâmica cíclica. Esse dinamismo tem duas faces. Caso haja planejamento e acompanhamento, é possível impedir que as áreas que se estruturaram em função de uma atividade entrem em colapso se essa atividade deixar de existir. É o caso, por exemplo, da Zona Portuária do Rio de Janeiro.

Mas, como os espaços urbanos são constituídos ainda majoritariamente pela ótica do “semeador”, tudo vem a reboque e embolado. Sem planejamento e manejo constantes, áreas são espontaneamente ocupadas, atividades econômicas florescem desordenadamente e, com isso, geram um forte impacto na capacidade estrutural, com amplas consequências sociais. Por trás de toda a revitalização, existe uma história de fracasso. Ainda que importantes, não adiantam leis sem que o ordenamento se faça real. O Poder Público, quase sempre, vê com desleixo os movimentos econômicos e sociais das suas cidades. Lucram e surfam hipocritamente na onda do sucesso para depois se fingirem de morto quando as coisas desandam. No final, só resta revitalizar.